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Nasci em Minas de S. Domingos, uma pequena aldeia do Baixo Alentejo, no dia 19 de Maio de 1955. As minhas raízes são fortemente alentejanas. Cedo se revelou o meu gosto pela escrita. Comecei por escrever histórias, versos, poemas curtos mas longos no sentimento. Aos poucos foram crescendo, ganhando alma, criando à minha volta desejos, desnudando sentimentos onde encontrei muito para chorar. Quando escrever se tornou para mim uma dependência compreendi que era através da escrita que encontrava sossego sempre que sopros grosseiros de desordem invadiam a minha vida. Escrever é para mim um enorme prazer mas é também preocupação e responsabilidade: Preocupação como forma de disciplina, responsabilidade como contrapartida de uma vida livre. Escrevo pondo de lado todos os medos, e desfruto desse acto criativo, inventando, porque a literatura é uma invenção. Com frequência os meus livros nascem de ideias abstractas que vão ganhando forma à medida que as personagens se vão dispondo e arrumando sem conflituosidade. Escrevo com o coração, reescrevo com a cabeça e, por fim, dou-lhe alma.

domingo, 22 de julho de 2012



Há muito que resolvi vestir a roupa do desapego, ficar sem tempo para odiar quem me odeia e ocupá-lo com quem me ama.
Um amor que despertou em mim todos os desejos. Um amor que vive de gestos e palavras ditas com a beleza de um discurso ao sabor dum romantismo que, nos dias de hoje, tende a desaparecer.
E não me arrependi.
Não perco tempo a compreender o passado. Passou. Aprendi a conhecer o amanhã. Levanto a cabeça. À minha frente, há uma linha erecta, justa, que me permite perceber que é esse o caminho certo. 
Perceber que se não tratar do meu jardim não conseguirei colher as rosas, que se não procurar um filho, nunca o encontrarei, que a amizade pode morrer na mentira, que o amor é perene como o sol que a beleza abre muitas portas mas que é o bom carácter que as mantém abertas e que a vida tem de ser uma plataforma giratória de afectos.
Não me importa uma boa dose de amnésia se ela der lugar à sabedoria, à sapiência. Não importa que meu rosto perca frescura, se o espelho ainda me envaidece com sonhos. Não importa que o meu corpo reinvente novas formas, se eu sei que se me emprestou na maternidade. Não importa que as minhas mãos percam firmeza e beleza se elas estiveram comigo em muitas histórias. Não importa que não liguem ao meu escrevinhar se sei que quem escreve, reparte.
Não! Não sou uma heroína: nunca ganhei uma guerra, mas venci muitas batalhas, nunca permitindo ser derrotada por um falhado mas por um adversário forte, conhecendo os opostos, vencendo focos de instabilidade, tendo como única arma o meu amor-próprio num espaço comum, numa cumplicidade vitoriosa.

domingo, 15 de julho de 2012

Tertúlia Amabraça




A livraria LeYa na Buchholz  no dia 9 de Abril de 2012, aconteceu mais um momento mágico. Houve poesia e poetas. Foi um prazer, e uma honra estar presente.





Alice Vieira
Alice Vieira e Lília Tavares
Joaquim Pessoa e José Luís Outono

Alice Ruivo



sexta-feira, 13 de julho de 2012

poesia

A FORÇA DO ESPERAR

Outrora acreditei que muros
Separavam homens de outros homens
E terras de outras terras.
Afinal tudo os une
E se algum muro havia,
Ele era meu.
Passei de juventude a muro transparente
SAI.
Toquei coisas e seres que senti.
Atravessei o muro cristalino
TEMPO.
Não deixes que se eleve ante os meus olhos
Outra muralha.
Agora escura e baça contra a qual toda a luz se desfaça.
Enquanto houver beleza para amar
Ou uma luta por decidir,
Enquanto alguém ainda me falar
E for preciso crescer para ouvir,
Se houver mais terra para visitar
E for preciso crescer para lá ir,
Enquanto houver um livro para ler
Vida para encontrar nos outros e em mim,
TEMPO
Ensina-me a crescer até ao fim.
Pequeno texto do meu próximo livro FLOR DE CARDO

...desci a escada seguido por Romeu, um labrador adulto de cabeça gigante de pelo magnífico preto de azeviche.
Pedia-me festas, parei e ele exibiu a sua habilidade de campeão olímpico de salto em altura, preparando-se para pousar as patas nos meus ombros. «não vês que me sujas romeu. Hoje é o casamento do nosso menino. Vai ter com ele. Vai gostar de te ver». Obedeceu. Francisco fez-lhe uma festa no focinho e ele emitia gritos dilacerantes de alegria, limpando-lhe com a língua a cara e as orelhas enquanto fustigava o ar com a cauda peluda.
Segui-o até ao jardim onde o Francisco, já pronto, contemplava o belíssimo chão azul da piscina daquela casa que eu construíra com esforço e trabalho.
Adorava a minha casa e tudo o que ela representava. A casa mais do que um simples objecto, era o centro humano da minha família. Nela guardava agora a intimidade do meu ser, transportando para ela memórias de protecção, revivendo o seu calor, sendo certo que deixarei para os meus filhos a casa natal que eu nunca tive e o que dela me lembrava, não passava de um espaço de solidão, decepcionante. Uma infância melancólica de miséria efectiva. Essa ausência deixou marcas até á vida adulta. Dentro desta casa natal, que vê, vela, vigia e espera, os meus filhos podiam sonhar a infância, sonhar o refúgio, o ninho, e alojar-se no seu espaço de felicidade, enquanto eu a sentia como o centro cósmico que alimentava os meus devaneios poéticos...
Soltarei meus pés
na dança do coração
e numa toada de amor
contigo partilharei meus passos.
Lentos, rápidos, bravios
no recinto, no leito, na vida.
Alice Ruivo

quinta-feira, 12 de julho de 2012

. "Escolhemos os nossos amigos por várias razões: por gostarmos dos mesmos livro, da mesma musica ou porque nos rimos das mesmas coisas. Estes amigos pela aproximação de valores, às vezes ficam connosco muito tempo mas raros são os que ficam para toda a vida. O que fica portanto são aquelas amizades que vamos fazendo ao longo da vida, que nunca exigem de nós grandes compromissos, de relação e discurso fáceis em que as palavras fluem, plenas de humor e quiçá, inteligentes.
Também são importantes. Mas por mais que o sejam, não é suficiente para fundamentar essa coisa fantástica que é termos alguém em quem confiar ou alguém que nos ofereça um "ombro" ou no socorra a um grito de desespero.
Fazer um amigo é preciso uma vida inteira.
Júlia era a amiga que Teresa pretendia para a vida inteira. Não tinha, todavia, sabido mantê-la. Não ficou atenta aos sinais, nem prestara atenção ao que “não foi dito”
Tinha prometido a Magda que procuraria Júlia quando regressasse a Lisboa. Assim fez. Telefonou primeiro.
Deparou-se, com uma amizade que se sentia traída, cheia de rancor, mostrando as garras da indiferença, furiosa por ter sido desperdiçada. A chave enferrujou de tanto esperar e a amizade, tal como a fechadura, ficou presa. Júlia não lhe explicou porque estava tão zangada e por esta altura, depois de tanto discutirem ao telefone, Teresa também já não queria saber.
Por cortesia e apenas por isso acordaram marcar um encontro mas ambas sabiam que o período de hostilidade havia recomeçado e até que não percebessem que haviam exagerado e que a irritação esfriasse, não se encontrariam ou falariam. Não sabia contudo porque, depois disto, se sentir melhor. Aquela discussão veio proporcionar-lhe alguma paz de espírito, como alguém que pensa: “eu tentei. Não podem dizer que não tentei” Teresa não de furtava a um bom confronto e tinha-o conseguido. Preferia o grito dos maus ao silêncio dos bons. Por fim concluía tão-somente isto: Júlia não fora merecedora da minha amizade”. Ponto final..."
Alice Ruivo
Acordei com o sonho que a noite me deu. Com ele esfreguei os olhos e espreguicei meu esqueleto grande e rude.
Saltei da cama. Senti o calor do chão nos meus pés e o clarão que viria a ser dia despertou-me para a realidade.
É Sexta-Feira! Lembrei-me.
Pareceu-me um dia cheio de solicitude e bondade.
Para todos os meus amigos, um feliz dia e um excelente fim-de-semana.
Alice Ruivo
Coloquei-me em frente ao espelho, prendi os meus cabelos com uma fita de chita, em laço.
Senti-me menina.
Recuei ao tempo em que as primaveras eram doiradas e os raios de sol ENCHIAM DE FRESCURA A MINHA INFANCIA.
A pele do meu rosto era lisa, brilhante e fresca, as minhas ideias postiças, de referências literárias, inventadas, imaturas.
Pintava leituras, escrevia imagens e tudo parecia exequível.
Olhei-me de soslaio.
Desconfiei da imagem reflectida no espelho.
Soltei o laço de Chita e o cabelo escorregou pelos meus ombros com reflexos iridescentes.
Ainda me vi bonita e fresca, de seios e lábios firmes, de sorriso fácil.
Ainda vi a cor da terra, do fogo, o amarelo das planícies e o verde das montanhas e o riacho da minha aldeia que brotava água fresca e cristalina e onde os homens iam refrescar-se lembrando que são homens.
Recordei o tempo em que os amigos apareciam sempre e os outros quando tinham tempo: amei-os todos.
E este cântico que entoou estes dias do meu mundo,
ENCHERA DE FRESCURA PARTE DA MINHA JUVENTUDE
Abandonei o laço de Chita.
Com um gancho, amparei duas melenas do cabelo, que me chegava á linha dos ombros. Movi-o e abanei a cabeça num gesto intuitivo que parecia devolver-me a frescura do passado.
Sim. As mãos que seguravam os ganchos ainda eram firmes.
Mãos de uma vida, de muitas histórias, mãos que ainda afagam, mãos que estiveram presentes.
O rosto, esse, perdera o brilho, as rugas ganharam forma sustentando o choro e o riso, o tempo que o relógio marcou e a alegria que esse tempo sustentou.
Cantei lágrimas, chorei alegrias. Passei por ventos e mares, tempestuosas verdades, por sonhos e desilusões que conhecem tempestades.
Na alma ainda tenho a doçura mas no coração o desalento porque o corpo sempre atento não nos devolve a juventude.
Abandonei o espelho. Não era importante a mulher que via no espelho, mas a que estava na minha cabeça.
E essa sim.
ESTAVA PREPARADA PARA ENCHER DE FRESCURA TODA A MINHA VELHICE.