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Nasci em Minas de S. Domingos, uma pequena aldeia do Baixo Alentejo, no dia 19 de Maio de 1955. As minhas raízes são fortemente alentejanas. Cedo se revelou o meu gosto pela escrita. Comecei por escrever histórias, versos, poemas curtos mas longos no sentimento. Aos poucos foram crescendo, ganhando alma, criando à minha volta desejos, desnudando sentimentos onde encontrei muito para chorar. Quando escrever se tornou para mim uma dependência compreendi que era através da escrita que encontrava sossego sempre que sopros grosseiros de desordem invadiam a minha vida. Escrever é para mim um enorme prazer mas é também preocupação e responsabilidade: Preocupação como forma de disciplina, responsabilidade como contrapartida de uma vida livre. Escrevo pondo de lado todos os medos, e desfruto desse acto criativo, inventando, porque a literatura é uma invenção. Com frequência os meus livros nascem de ideias abstractas que vão ganhando forma à medida que as personagens se vão dispondo e arrumando sem conflituosidade. Escrevo com o coração, reescrevo com a cabeça e, por fim, dou-lhe alma.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Coloquei-me em frente ao espelho, prendi os meus cabelos com uma fita de chita, em laço.
Senti-me menina.
Recuei ao tempo em que as primaveras eram doiradas e os raios de sol ENCHIAM DE FRESCURA A MINHA INFANCIA.
A pele do meu rosto era lisa, brilhante e fresca, as minhas ideias postiças, de referências literárias, inventadas, imaturas.
Pintava leituras, escrevia imagens e tudo parecia exequível.
Olhei-me de soslaio.
Desconfiei da imagem reflectida no espelho.
Soltei o laço de Chita e o cabelo escorregou pelos meus ombros com reflexos iridescentes.
Ainda me vi bonita e fresca, de seios e lábios firmes, de sorriso fácil.
Ainda vi a cor da terra, do fogo, o amarelo das planícies e o verde das montanhas e o riacho da minha aldeia que brotava água fresca e cristalina e onde os homens iam refrescar-se lembrando que são homens.
Recordei o tempo em que os amigos apareciam sempre e os outros quando tinham tempo: amei-os todos.
E este cântico que entoou estes dias do meu mundo,
ENCHERA DE FRESCURA PARTE DA MINHA JUVENTUDE
Abandonei o laço de Chita.
Com um gancho, amparei duas melenas do cabelo, que me chegava á linha dos ombros. Movi-o e abanei a cabeça num gesto intuitivo que parecia devolver-me a frescura do passado.
Sim. As mãos que seguravam os ganchos ainda eram firmes.
Mãos de uma vida, de muitas histórias, mãos que ainda afagam, mãos que estiveram presentes.
O rosto, esse, perdera o brilho, as rugas ganharam forma sustentando o choro e o riso, o tempo que o relógio marcou e a alegria que esse tempo sustentou.
Cantei lágrimas, chorei alegrias. Passei por ventos e mares, tempestuosas verdades, por sonhos e desilusões que conhecem tempestades.
Na alma ainda tenho a doçura mas no coração o desalento porque o corpo sempre atento não nos devolve a juventude.
Abandonei o espelho. Não era importante a mulher que via no espelho, mas a que estava na minha cabeça.
E essa sim.
ESTAVA PREPARADA PARA ENCHER DE FRESCURA TODA A MINHA VELHICE.

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