A minha foto
Nasci em Minas de S. Domingos, uma pequena aldeia do Baixo Alentejo, no dia 19 de Maio de 1955. As minhas raízes são fortemente alentejanas. Cedo se revelou o meu gosto pela escrita. Comecei por escrever histórias, versos, poemas curtos mas longos no sentimento. Aos poucos foram crescendo, ganhando alma, criando à minha volta desejos, desnudando sentimentos onde encontrei muito para chorar. Quando escrever se tornou para mim uma dependência compreendi que era através da escrita que encontrava sossego sempre que sopros grosseiros de desordem invadiam a minha vida. Escrever é para mim um enorme prazer mas é também preocupação e responsabilidade: Preocupação como forma de disciplina, responsabilidade como contrapartida de uma vida livre. Escrevo pondo de lado todos os medos, e desfruto desse acto criativo, inventando, porque a literatura é uma invenção. Com frequência os meus livros nascem de ideias abstractas que vão ganhando forma à medida que as personagens se vão dispondo e arrumando sem conflituosidade. Escrevo com o coração, reescrevo com a cabeça e, por fim, dou-lhe alma.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

CARTAS. IN "O AMARGO E DOCE SABOR DA VIDA "

“Querido filho.
Hoje está muito frio. Estamos em Fevereiro e eu aqui, com a lareira acesa onde me encontro, nesta hora tardia depois de um dia de trabalho, dir-se-ia que não se poderia estar melhor, em qualquer outra parte do mundo. Todavia, o calor que sai destas brasas e que aqueceriam qualquer pessoa, não aquece o meu coração. Este gela, arrepia-se mesmo, ao pensar que estás tão distante. Consolo-me a olhar todas as fotos que tirámos juntos. Fecho os olhos e a imagem desses tempos torna-se real, sentida e desejada. Peter, se o meu pensamento te tornasse feliz, serias a criatura mais feliz ao cimo da terra, pois penso em ti todos os dias a todas as horas... Tudo me lembra a tua presença: Quando o Ricardo me chama de mãe, lembro-me de ti, quando a Sara me abraça, lembro-me de ti, quando o sol me acaricia o rosto, lembro-me de ti, quando entro em casa lembro-me de ti... Queria tanto que fosses feliz.
As lágrimas começam a correr quando te escrevo. Quando te posso ver outra vez? No dia em que isso acontecer, não vou precisar de lareira, nem de sol, nem de comer pois só a tua presença será suficiente para me trazer tudo o que me falta.
Por favor, filho, nunca me esqueças.
Mil beijos da Mãe."

"Querida Mãe
Como sabes, recebi a tua carta. Falei ontem contigo ao telefone. Todavia, ao telefone as palavras não me saem tão bem. Se calhar herdei de ti o gosto pelas palavras escritas.
Quando ai estive, li um poema teu que continha, entre outras, as seguintes palavras:

... Muita coisa acontece sob a crosta da terra
onde o ar foi sorvido,
onde o sol não penetra
onde o céu toca o chão
e os seres são curvados
ao peso de uma força que os oprimem
e não conhecem...

Não sei porque me dizem tanto estas palavras. Talvez, penso, porque as coisas menos boas que acontecem sob a crosta da terra são fruto da ignorância dos homens que, com o seu ódio, tapa o sol e sorve o ar e o peso que os oprime é a sua própria força abandonada em forma errada. O peso da sua própria consciência.
Ao deixar de ser um ser curvado, descobri que já não sei escrever angústia, porque em mim já não existe. Não sei escrever ódio porque tal já não sinto, sei apenas escrever saudade. Saudades de ti, saudades de um beijo, saudades de um abraço. Ao deixar de ser curvado, consegui olhar em meu redor e descobri que o amor existia. Vou regressar.
Importas-te de preparar o meu quarto?
Um beijo do teu filho Peter."

1 comentário:

  1. Foi o primeiro livro que li da autora. Confesso que fiquei bastante surpreendido e emocionado com certas passagens, sobretudo os diálogos, mãe-filho. A autora aí, transcende-se de tal maneira que nos transmite as tensões quando, esse momento sublime,de encontro, nos envolve, também, nas emoções, nos sentimentos profundos de uma mulher,sobretudo de uma MÃE! Vou ler novamente Bjos do amigo Helder Gonçalves

    ResponderEliminar